Dois anos depois, onde estão e o que fazem alguns dos principais nomes ligados ao Caso Marielle?

Dois anos depois, onde estão e o que fazem alguns dos principais nomes ligados ao Caso Marielle?

Mudanças ocorreram na Polícia Civil e no Ministério Público; ministro da Segurança na época dos assassinatos e vereador falsamente acusado comentam o crime. Há exatos dois anos, no dia 14 de março de 2018, foram assassinados a tiros no Rio de Janeiro a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes. Desde então, muitas perguntas referentes ao crime surgiram – entre elas: quem matou? Quem mandou matar? E por quê?

Passados 731 dias do atentado, o G1 conta neste sábado (14) onde estão e o que fazem pessoas que se envolveram ou foram envolvidas no caso.

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Orlando Curicica

Ex-PM e miliciano Orlando de Curicica, que foi implicado por testemunha na morte de Marielle e do motorista Anderson

Reprodução TV Globo

O ex-policial militar e miliciano Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica, chegou a ser acusado de ser um dos mandantes do crime contra a vereadora e o motorista. Mais tarde, a suspeita foi desmentida.

Na época em que foi implicado nos assassinatos, Orlando estava preso em Bangu 9, no Complexo Penitenciário de Gericinó, na Zona Oeste do Rio. Posteriormente, foi transferido para o presídio federal de segurança máxima em Mossoró, no Rio Grande do Norte, onde permanece até hoje.

A suposta participação do miliciano no crime e a transferência para uma unidade prisional fora do estado deram margem para que Orlando passasse a acusar autoridades policiais de corrupção e coação.

O miliciano afirmou, por exemplo, que o ex-chefe de Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa, teria recebido dinheiro quando esteve à frente da Divisão de Homicídios para não investigar crimes que tinham envolvimento com a contravenção – a acusação foi negada pelo delegado.

Raul Jungmann

Ex- ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, durante cerimônia em 2018

Marcelo Camargo/Agência Brasil

Raul Jungmann, ministro da Segurança Pública na época do crime, declarou que não havia dúvidas da participação de milicianos no crime contra Marielle e Anderson. Ao assumir a pasta, Jungmann deixou o mandato de deputado federal na Câmara, em Brasília, e acompanhou de perto a investigação do Caso Marielle.

Em entrevista ao G1 esta semana, Jungmann afirmou que o policial militar reformado Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio de Queiroz – presos acusados pelo crime – "se encaixam na descrição [de suspeitos]".

A avaliação inicial do ex-ministro de que o crime envolveria milicianos vai de encontro às informações da Polícia Civil e do Ministério Público fluminense. A princípio, as apurações não indicaram que Lessa ou Élcio sejam integrantes de milícia.

Favorável à federalização do caso, Jungmann foi um dos entusiastas da proposta gestada pela ex-procuradora geral de Justiça, Raquel Dodge.

O ex-ministro, inclusive, está esperançoso quanto ao julgamento no Superior Tribunal de Justiça que determinará se procede o pedido de deslocamento de competência. A sessão está marcada para o dia 31 de março.

"Espero que haja uma federalização porque a Polícia Federal é excelente. Alguns temem a politização [do caso], mas acredito que ela fará um trabalho independente e de qualidade, que poderá ser decisivo para que se chegue ao mandante", avaliou Jungmann.

O ex-ministro deixou a Câmara dos Deputados logo após o fim do governo Temer e, atualmente, trabalha na iniciativa privada, em um parque tecnológico de Recife, Pernambuco, na área de tecnologia da informação.

General Walter Braga Netto

O interventor federal na Segurança Pública no Estado do Rio de Janeiro, general do Exército Walter Souza Braga Netto, durante entrevista coletiva realizada no centro da cidade. Netto deu detalhes do plano de ação para o Rio

Fabio Motta/Estadão Conteúdo

Nomeado interventor federal na Segurança Pública no Rio de Janeiro durante o governo de Temer, o general do Exército Walter Souza Braga Netto começou no cargo apresentando detalhes de ações propostas para o estado. A gestão dele começou em 16 de fevereiro de 2018.

O oficial ocupou o cargo até dezembro do mesmo ano, quando voltou para o Exército e assumiu o cargo de Comandante Militar do Leste. Depois, assumiu o comando do Estado-Maior do Exército.

Em fevereiro de 2020, Braga Netto foi convidado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, para o cargo de chefe da Casa Civil da Presidência da República, onde está desde então.

General Richard de Souza Nunes

O general Richard Nunes foi secretário de Segurança do Rio em 2018

Reprodução/GloboNews

O general de Divisão do Exército Brasileiro Richard Nunes foi escolhido por Braga Netto para assumir a Secretaria estadual de Segurança Pública do RJ (Seseg) durante a Intervenção Federal. A missão foi aceita pelo oficial, que assumiu o cargo no lugar do delegado federal Roberto Sá.

Durante o período em que esteve à frente da extinta secretaria, Nunes evitou conceder entrevistas sobre o Caso Marielle. Apesar disso, ele participava de reuniões semanais com o chefe da Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa; com o delegado titular da Delegacia de Homicídios, Giniton Lages; e com o então promotor do caso, Homero Freitas.

Em um dos raros momentos que se dispôs a tratar do crime, em entrevista ao jornal Estado de São Paulo o general afirmou que milicianos mataram Marielle devido a conflitos envolvendo questões fundiárias na Zona Oeste.

À GloboNews, ele reforçou que o caso envolvia milicianos. Em fevereiro de 2019, após deixar o cargo no RJ, ele assumiu a chefia do Centro de Comunicação Social do Exército (CComsex).

Homero das Neves Freitas

Homero Freitas (à direita), ao assumir cargo de procurador em setembro de 2018. Ele se aposentou em 2019

Divulgação/Amperj

O promotor de Justiça do Ministério Público Homero das Neves era o responsável "natural" pelo Caso Marielle. Cabia a ele se encarregar de denunciar criminosos e levar à Justiça os inquéritos da Delegacia de Homicídios da Capital.

Antes do crime contra a vereadora e o motorista, Neves atuou em casos de grande repercussão no Rio, como o desaparecimento de Amarildo – pedreiro que sumiu após abordagem de policiais da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha, em junho de 2013.

Depois de ficar cinco meses à frente do Caso Marielle, em agosto de 2018 Homero deixou a investigação para assumir uma vaga como procurador de Justiça. Em fevereiro de 2019, se aposentou e hoje trabalha como advogado. Procurado pelo G1 , Neves não respondeu aos questionamentos.

Após a saída de Neves, assumiu a investigação a promotora Letícia Emiliy, que optou por trabalhar com as estruturas do Grupo de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), e com a Coordenadoria de Segurança e Inteligência (CSI), ambos do MPRJ.

Em comunicado, o MP informou que na manhã de sexta-feira (13), a coordenadora Gaeco, promotora de Justiça Simone Sibilio, falou sobre os desdobramentos do caso com familiares de Marielle e de Anderson.

"Posso garantir o absoluto empenho da nossa equipe, que resultará na elucidação do caso, com o esclarecimento se houve ou não a figura do mandante", afirmou a promotora.

Rivaldo Barbosa

Rivaldo Barbosa (no centro), chefe de Polícia Civil na época do crime, concede entrevista no dia seguinte à morte de Marielle e Anderson

Reprodução / TV Globo

O delegado Rivaldo Barbosa foi nomeado chefe de Polícia Civil do RJ no dia 6 de março, oito dias antes do assassinato de Marielle e Anderson Gomes. Na véspera do crime, ele foi empossado prometendo combater casos de corrupção na corporação.

Depois do crime, Rivaldo recebeu a família de Marielle no gabinete da chefia de Polícia, no Centro do Rio. No dia seguinte às mortes, o delegado declarou que o caso se tratou de um atentado contra a democracia.

Em dezembro de 2018, Orlando da Curicica, em depoimento, afirmou que o então diretor da Divisão de Homicídios e outros policiais receberam R$ 300 mil para não investigar a morte de um contraventor, ocorrida em 2016.

Rivaldo sempre negou as acusações e afirmou, na época, estar com a "consciência tranquila". Atualmente, o delegado é coordenador do Centro de Comunicação e Operações Policiais da Polícia Civil.

Marcello Siciliano

Vereador Marcello Siciliano (PHS) chega para depor na delegacia de Homicídios em abril de 2018

Henrique Almeida/G1

O dia 8 de maio de 2018 marcou o início do que o vereador do Rio Marcello Moraes Siciliano (Podemos), de 48 anos, classifica como "pesadelo".

Marielle – colega de Siciliano na Câmara – e Anderson estavam mortos havia 55 dias quando o jornal O Globo publicou uma reportagem revelando que uma suposta testemunha apontava o vereador e o miliciano Orlando Curicica como mandantes do crime. Siciliano sempre negou as acusações.

"Eu sou vítima tanto quanto a Marielle, só não morri", afirmou ao G1 o parlamentar.

O policial militar Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha, (nome que só seria conhecido mais tarde) foi quem implicou Siciliano e Orlando Curicica no caso. Na Delegacia de Homicídios, Ferreirinha disse ter ouvido o político e Curicica armarem o assassinato da vereadora.

De "testemunha-chave", Ferreirinha passou a mentiroso. A mudança ocorreu quando a própria advogada do PM, Camila Nogueira, veio a público dizer – em março de 2019 – que uma das linhas de investigação do caso era baseada em mentiras.

Apesar do desmentido, a suspeita de participação no crime passaria a ser um fantasma que acompanharia Siciliano. O vereador, que tem pai e mãe americanos, está impedido de viajar aos Estados Unidos e uma de suas filhas chegou a ser hostilizada na universidade onde estudava.

"[Senti] Muita vergonha. As pessoas me olhavam, me pré-julgavam... Porque a imprensa tem esse poder de persuadir as pessoas", avaliou.

Ainda hoje, Siciliano disse que tenta conseguir o visto para entrar nos Estados Unidos. A autorização, segundo ele, é negada com base na repercussão dada ao caso pela imprensa. A última resposta que recebeu, diz, garante que os motivos para a recusa serão analisados pelo cônsul norte americano.

Questionado sobre os rumos da investigação – que por enquanto não apresentaram um mandante, Siciliano disse que torce para que o caso seja esclarecido porque, segundo ele, será importante para que as pessoas que "não tiveram acesso à verdade" finalmente saibam o que aconteceu.

"Peço muito que tudo isso seja esclarecido. É importante que as pessoas que não tiveram acesso, quando o mandante for preso, ou mandantes, que se Deus quiser serão, acho que vai ser muito bom porque vai ser uma repercussão mundial", afirmou o vereador.

Tarcísio Motta

Tarcísio, ao centro, com Marielle Franco à direita e Talíria Petrone, vereadora do PSOL em Niterói, à esquerda, em foto de 2018

Tarcísio Motta/Arquivo Pessoal

Em 2017, Tarcísio Motta foi diplomado no cargo de vereador do Rio ao lado de Marielle Franco – ambos foram eleitos pelo PSOL. No pleito, realizado no ano anterior, Tarcísio recebeu mais de 90 mil votos, enquanto Marielle teve pouco mais de 46 mil.

O contato entre os dois era diário. Como parlamentares, Tarcísio e Marielle trabalhavam em gabinetes vizinhos e constantemente debatiam assuntos ligados à Câmara. Dois anos após a morte da parceira de bancada e amiga, a palavra de Tarcísio que resume o caso é angústia.

"É uma angústia tremenda dois anos depois a gente ainda estar sem resposta sobre quem planejou, quem pensou e por que foi feito isso. É uma angústia não só pela injustiça, mas também por não entendermos os motivos desse crime político bárbaro", desabafou.

Para o vereador, é provável que os mandantes do crime sejam pessoas "muito poderosas". As prisões em março de 2019 de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, segundo Tarcísio, significaram a esperança de que, um dia, quem determinou a execução seja preso.

"[Prender Lessa e Queiroz] É uma resposta ainda muito limitada porque nós sabemos que não foram aquelas pessoas que planejaram. Mas é claro que os assassinos também têm responsabilidade", ponderou Tarcísio.

Neste ano, Tarcísio conclui o mandato como vereador do Rio.

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