Agronegócio sofre com a estiagem no Sul

Agronegócio sofre com a estiagem no Sul

Pandemia, ciclone e nuvem de gafanhotos. O Sul do Brasil tem sofrido ameaças de todos os lados, mas nenhuma deve somar tantos prejuízos à agricultura e à pecuária do que a seca histórica na região. A falta de chuvas em momentos essenciais para as mais diferentes lavouras impacta o bolso de produtores, que reclamam da falta de assistência governamental.

No Paraná, a estiagem fez o governo decretar em maio situação de emergência hídrica. A seca é a mais forte dos últimos 30 anos e vem diminuindo com as chuvas das últimas semanas, mas atingiu as lavouras de grãos, como milho e feijão, apesar de não ter comprometido a soja, cuja colheita, anterior ao período, bateu o recorde do estado, com 20,36 milhões de toneladas.

"A gente teve todo tipo de problema esse ano: estiagem, frente fria com geadas e até excesso de chuva na hora em que o feijão estava pronto", resume o presidente do Instituto Brasileiro de Feijão e Pulses (Ibrafe), Marcelo Lüders.
As complicações baixaram em cerca de 20% os números de colheita do grão em relação à expectativa anterior da entidade e fizeram o preço disparar no mercado. O feijão-carioca, cuja saca custava menos de R$ 200 no início do ano, chegou ao pico de R$ 310 em maio. Só na segunda safra, que está sendo colhida agora, as plantações somam prejuízo de R$ 375 milhões.

Como aponta Lüders, a baixa quantidade e qualidade do grão paranaense fez com que o estado também desperdiçasse mercados. "Estamos perdendo uma grande oportunidade com o México, por exemplo, que veio com uma demanda alta que não podemos acolher", diz.

 

 

O milho também sofreu com a seca no Paraná. A queda foi em torno de 14% em relação à safra anterior, de acordo com o governo. Segundo o diretor da Associação Brasileira de Produtores de Milho (Abramilho), Paulo Bertolini, há lavouras com perdas de até 40%.

"E o estado ainda está com déficit hídrico apesar das chuvas dos últimos dias", lembra.

Santa Catarina tampouco escapou da estiagem. Juntas, as culturas de soja, milho e feijão perderam R$ 405 milhões até então, com quedas de produção que giram em torno de 7%, segundo a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural (Epagri).

"A estiagem foi forte principalmente no meio-oeste. Inicialmente, provocou atraso no plantio, mas permaneceu ao longo da safra", explica Gláucia de Almeida Padrão, analista da Epagri.

Já no Rio Grande do Sul, a seca que se alastra desde dezembro atinge cerca de 83% dos municípios. Entre os 412 afetados, 409 decretaram situação de emergência.

Os produtores de soja e milho tiveram um prejuízo de R$ 15,4 bilhões por causa da falta de chuvas. A quebra na safra de soja foi de 47%, enquanto na do milho foi 30%, segundo Paulo Pires, presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do RS (FecoAgro/RS).

"A lavoura é como um ser humano que precisa de água e alimentos regularmente. Não adianta uma pessoa tomar três litros de água em um dia e passar vários sem beber nada. Foi mais ou menos isso que aconteceu. Choveu, mas com períodos longos e críticos de seca", explica.

Estado bastante dependente da economia rural, o Rio Grande do Sul possui 128 cooperativas agropecuárias, com 350,2 mil associados e 36,6 mil empregados, segundo o Sistema Ocergs-Sescoop/RS, que representa o cooperativismo.

"Quando um produtor perde uma safra, é como um trabalhador urbano não receber o salário do ano. É horrível. Os produtores têm contas e não têm o dinheiro", exemplifica Pires.

Segundo ele, os pequenos produtores, especialmente os cooperativados, não sentiram "efeito prático" das medidas de auxílio governamental tomadas pelo Ministério da Agricultura.

Entre as ações anunciadas ainda em abril estão a prorrogação no pagamento de empréstimos, a criação de linhas de crédito especiais e financiamento de capital de giro para cooperativas.

Em junho, a pasta ainda autorizou a renegociação de financiamentos ao amparo do Fundo de Terras e da Reforma Agrária (FTRA) aos agricultores familiares.

No Paraná, o governo ainda oferece um "socorro" a mais para os produtores que sofrem perdas, como ressalta Salatiel Turra, chefe do Departamento de Economia Rural da Secretaria da Agricultura e Abastecimento.

"Ao lado de São Paulo, é uma iniciativa única de fazer com que o produtor se endivide menos com uma espécie de contrato de seguro", explica.

Bertolini, da Abramilho, destaca, porém, que, para o seguro valer a pena, o produtor teria que perder praticamente toda a safra ou, ao menos, "colher muito pouco".

Com seca nas plantações, o gado leiteiro também sofreu. Ficou sem pasto, sem grãos e precisou de reforço na alimentação. A complementação aumenta os custos dos produtores, que já vinham pressionados por mudanças no setor –11 mil fazendas do Sul deixaram a atividade por ano, em média, nos últimos cinco anos.

"Temos um paradoxo: quando temos pasto, não temos sol para fazer feno. É difícil porque é preciso de quatro a cinco dias de sol, que não tem no inverno. Então, fazemos o "pré-secado" com 12 horas de sol e "embola", para poupar a silagem de milho", explica Marcos Lang, presidente da Associação dos Criadores de Gado Holandês do Rio Grande do Sul (Gadolando).