Esperar imunidade de rebanho "é absurdo e antiético", diz líder de estudo no Brasil

Esperar imunidade de rebanho

 

Os cientistas do Centro de Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) fizeram testes para detectar anticorpos contra o coronavírus em 89.397 pessoas de 133 cidades de vários Estados e entrevistas para entender como o vírus afeta diferentes classes sociais e grupos étnicos.

A investigação indica que o Brasil está longe de atingir a chamada imunidade de rebanho. Isso ocorre quando uma parcela grande o suficiente da população foi infectada naturalmente e desenvolveu uma defesa contra o vírus. A doença não consegue se espalhar, porque a maioria das pessoas é imune. Esse patamar é estimado por especialistas em torno de 60% a 70%.

Diante disso, falar em atingir a imunidade de rebanho hoje é "quase uma piada", diz o epidemiologista Pedro Hallal, reitor da UFPel e coordenador da pesquisa.

"Mirar a imunidade de rebanho como uma política de saúde é uma ideia absurda, mal pensada e antiética", diz Hallal.

Um dos poucos países a buscar a imunidade de rebanho — e a abrir mão de medidas drásticas de isolamento social — foi a Suécia, citada pelo presidente Jair Bolsonaro, em maio, como exemplo a ser seguido. O Reino Unido cogitou seguir essa linha, mas as projeções de que isso levaria a milhares de mortes fizeram o governo recuar. Até agora, em comparação aos vizinhos nórdicos, a Suécia teve até sete vezes mais mortes e o declínio econômico foi equivalente ao de quem fechou comércios e escolas (já que habitantes evitaram circular nas ruas). Mas o número de mortes tem caído no país, o que reacendeu o debate sobre imunidade coletiva.

8 milhões

O estudo da UFPel também indica qual é o tamanho da subnotificação de casos no país: 3,8% da população equivale a 8 milhões de pessoas infectadas até 24 de junho, quando a pesquisa acabou.

De acordo com o Ministério da Saúde, havia 1,19 milhão de casos confirmados na mesma data. Ou seja, o número real de pessoas que contraíram o vírus seria seis vezes maior.

Esse trabalho mostra ainda que foram mais contaminados brasileiros amarelos (2,1%), pretos (2,5%), pardos (3,1%), e indígenas (5,4%) do que brancos (1,1%) e, que quanto mais pobre é uma pessoa, maior é o risco de ela ter covid-19. Para Hallal, isso indica que a política de combate à pandemia "fracassou".

Uma boa notícia é que a taxa de letalidade do vírus no país seria na realidade bem menor, cerca de 1% em vez dos 3,8% calculados hoje com base na relação entre casos e mortes oficiais.

A prevalência do vírus varia muito entre as cidades do país, segundo a pesquisa: entre 0% e 26,4% (em Sobral, no Ceará). As regiões Norte (8%) e Nordeste (5,1%) tiveram proporcionalmente mais testes positivos do que Sudeste (1,1%), Centro-Oeste (0,9%) e Sul (0,4%).

É nestas últimas duas regiões que o vírus mais avança hoje, quase cinco meses após o primeiro caso confirmado. A proposta de Hallal para mudar isso não é nada popular, como ele reconhece. "É hora de fazer um lockdown rigoroso no Sul e no Centro-Oeste."

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