Fabricante da Sputnik driblou proibição de firmar contrato com o governo e ganhou dispensa de licitação

 

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A última decisão foi unânime de desembargadores da 7ª turma do TRF-2 (Tribunal Regional da 2ª Região), no dia 16 de dezembro.

A empresa argumentou que, se fosse impedida, a medida traria “severas consequências” não apenas para ela “mas para os usuário do SUS (Sistema Único de Saúde), já tão apenado e desabastecido, em tempos de pandemia da Covid-19”.

Já os desembargadores alegaram que o Into não poderia agir de outro modo, senão aplicar a sanção “correspondente à conduta omissiva inegavelmente havida”.

Segundo a AGU (Advocacia-Geral da União), a penalidade de não poder licitar e contratar com a União, com descredenciamento no Sicaf (sistema de cadastro de fornecedores do governo), foi aplicada à empresa dos dias 20 de julho a 20 de agosto do ano passado.

Porém, segundo consulta ao sistema de transparência do governo, foram assinados quatro contratos da União Química nesse período com o Ministério da Educação, para o fornecimento de materiais para hospitais universitários.

Três deles foram com dispensa de licitação, nos valores de R$ 124,3 mil, R$ 62,2 mil e R$ 47,2 mil. O único firmado com realização de pregão foi no valor de R$ 5.200.

Questionada, a AGU afirmou que “eventuais questões relativas aos procedimentos de contratação em si poderão ser mais bem dirimidas pelos órgãos contratantes, os quais possuem a gestão dos contratos celebrados e respectivos procedimentos administrativos de contratação”.

Já o MEC disse que as contratações foram feitas com um outro CNPJ da empresa e, portanto, não seria proibida pela medida.

A pasta também afirmou que “houve consulta ao Sicaf” e acrescentou “que não houve indicação de eventual impedimento de licitar e contratar com a União, que deve ser apontado em campo próprio”. “Dessa forma, não há que se falar em qualquer falha na instrução dos processos”, disse.

O MEC acrescentou que, “caso tenha havido algum erro no Sicaf, que deveria ter apontado suposto impedimento, a Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares) não pode ser responsabilizada pelo mesmo, considerando que não é responsável pela gestão do sistema”.

No entanto, em documento enviado pelo próprio ministério à reportagem, após a data da proibição o CNPJ da filial contratada aparece como “ocorrências impeditivas indiretas: consta. Verificar no Relatório de Ocorrências Impeditivas Indiretas”.

A União Química respondeu que participou de processo licitatório para fornecimento de dois medicamentos ao Into e “não foi classificada por não preencher os requisitos de menor preço”.

 

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“Ainda assim, por praxe, foi convocada, assim como todas as demais participantes da licitação, a apresentar, posterior à data de abertura do processo licitatório, os documentos relativos aos referidos medicamentos”, disse.

“A empresa não apresentou tais documentos pelo fato de não ter como avançar nas negociações por não ter o menor preço, como já havia ficado claro no resultado da licitação. Por isso, a empresa foi notificada e recebeu uma sanção administrativa, que exigia afastamento de 30 dias corridos em processos licitatórios junto ao Into, prazo que já foi cumprido”, afirmou.

Questionada sobre os contratos firmados nesse período, a União Química disse que “qualquer contrato eventualmente assinado em período de sanção é decorrente de processos licitatórios anteriores à aplicação da penalidade e portanto tem seus efeitos de execução suspensos neste período”.

Ao ser novamente provocada sobre a punição, que também inclui a assinatura de contratos, afirmou que os contratos mencionados são referentes à venda de medicamentos e produtos utilizados no tratamento da Covid-19, em consonância com a Lei 13.979/2020, que “autoriza contratações sem licitação, em circunstância de extrema urgência de saúde, como é o caso”.

Apesar do lobby político em torno da União Química, a aquisição da vacina Sputnik V contra a Covid-19, apresentada como parte dos planos do Ministério da Saúde para imunizar toda a população até o fim deste ano, ainda é vista como distante pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

A agência afirmou que faltam documentos para a autorização do uso emergencial do imunizante desenvolvido pelo Instituto Gamaleya, da Rússia, e de sua produção no Brasil.

A situação foi informada pelo diretor da agência, Antonio Barra Torres, no processo que acompanha o plano de vacinação do governo no STF (Supremo Tribunal Federal), sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski.

A empresa pediu aval à Anvisa para uso emergencial em 15 de janeiro. A agência, porém, devolveu a solicitação à empresa um dia depois, afirmando que faltavam os estudos clínicos da fase três, com dados sobre a segurança e eficácia do produto.