Comissão dá parecer inicial contra inclusão de técnica de "pulmão artificial" e remédio contra a Covid no SUS

Análise preliminar da Conitec, comissão que atua como órgão consultivo do Ministério da Saúde, deu parecer desfavorável à incorporação pela rede pública de um novo tratamento para pacientes de Covid e de um aparelho que atua como pulmão artificial e pode ser utilizado em alguns casos graves da doença.

O medicamento Regn-Cov-2 foi aprovado para uso emergencial em abril pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Já o ECMO (oxigenação por membrana extracorporal) ficou conhecido após ter sido usado pelo ator Paulo Gustavo.

O motivo, segundo a comissão, está na baixa oferta de dados que apontem benefícios após revisão de estudos (no caso do Regn-Cov-2) e dificuldade de implementação devido à falta de centros especializados (no caso do ECMO).

Foto: Miguel Schincariol/AFP

Agora, a previsão é que as propostas sigam em consulta pública por dez dias. Após esse período, a comissão, formada por membros do ministério e de outros órgãos, deve emitir um parecer final, que será encaminhado à Saúde.

O ECMO funciona como uma espécie de pulmão artificial com uso de máquina que oxigena o sangue fora do corpo, substituindo temporariamente o órgão comprometido de maneira severa. Não se trata de um tratamento específico para a Covid, mas de uma tecnologia que pode ser usada também nesses casos.

Documento da comissão lembra que o ECMO é indicado a pacientes com síndrome respiratória aguda grave decorrente de infecções virais, mas que sejam refratários ao uso de ventilação mecânica invasiva, técnica que costuma ser usada em UTIs.

Segundo relatório da Conitec, a estimativa é que 1% a 1,2% dos pacientes com ventilação mecânica precisem de ECMO, com custo estimado de R$ 15 milhões por ano ao SUS (a conta foi feita considerando o contexto de uso na pandemia).

A utilização, porém, é recomendada apenas em centros especializados e com equipes treinadas, o que colaborou para o parecer inicial pela não incorporação da técnica.

Em análise preliminar, membros da comissão avaliaram que, apesar dos benefícios do tratamento, “há uma grande dificuldade de ampliação e cobertura de tratamento para todos os pacientes que porventura iriam necessitar da terapia”.

Exemplo disso é que, de 30 equipes e centros no país que oferecem o ECMO, apenas 9 já estão no SUS, a maioria no Sudeste. Destes, só dois têm mais de 30 experiências anteriores.

“Assim, haveria uma iniquidade no atendimento à população em tratamento no SUS devido à concentração de equipe especializada em uma região e dificuldades de transferência destes pacientes para esses grandes centros”, diz o grupo, que aponta ainda a dificuldade de expandir locais na pandemia e a impossibilidade de oferta em hospitais de campanha.

“Para certificação, cada centro precisa ter realizado pelo menos cinco procedimentos supervisionados para se qualificar, portanto, inviável a criação de novos centros no contexto atual. E por fim, apenas uma pequena parcela da população necessitaria do procedimento”, diz.

Desde a última semana, a Conitec avalia possíveis tratamentos e protocolos contra a Covid, como uma diretriz voltada a pacientes hospitalizados e com diagnóstico da doença.

Conforme o jornal Folha de S.Paulo publicou, parecer que foi encaminhado ao grupo não recomenda o uso de cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina, entre outros, a pacientes internados, ao mesmo tempo em que indica corticoesteroides e anticoagulantes em alguns casos específicos.

O ministério pediu à Conitec uma análise do Regn-cov-2, medicamento composto pela associação dos anticorpos casirivimabe e imdevimabe e desenvolvido pela Roche, após sua aprovação pela Anvisa.

O tratamento é indicado pacientes com Covid com casos leves ou moderados, mas que apresentem alto risco de complicações. Entram nessa lista pacientes com idade avançada, imunodepressão, obesidade e doenças cardiovasculares.

O Regn-Cov-2 não é indicado a pacientes hospitalizados –o que fez com que o medicamento tivesse parecer desfavorável à inclusão na diretriz para internação.

A avaliação é que, apesar de ter um provável efeito de redução de internação e mortes, não há dados de segurança e eficácia em pessoas vacinadas e há “barreiras logísticas” para aplicação do medicamento no tempo indicado.

Além disso, a comissão também considerou que a existência de dados de estudos ainda parciais dificulta a análise sobre a extensão dos benefícios.

“A evidência apresentou incertezas importantes quanto a eficácia e segurança da tecnologia e, além disso, foi identificada dificuldade em captar a população indicada para seu uso, uma vez que o tempo recomendado para início do tratamento seria menor que o alcançado na prática clínica, dificultando aplicação no melhor momento do cuidado e resultando em riscos à saúde do indivíduo”, aponta relatório.

Em comunicado divulgado sobre o parecer da Conitec, a Roche, responsável pelo tratamento, afirma que “reconhece os desafios relacionados à gestão sustentável dos recursos frente à complexidade da pandemia, contudo discorda da decisão do órgão”.

A empresa diz que o tratamento, formado por um coquetel de anticorpos de administração intravenosa, tem “perfil de segurança e eficácia comprovados”.

“Os dados submetidos à avaliação da Conitec são os mesmos que subsidiaram a aprovação de Regn-Cov-2 nos nove países em que o produto está aprovado e que também foram apresentados para a autorização de uso emergencial pela Anvisa”, afirma a empresa, que aponta que o estudo reduziu o risco de hospitalização ou morte em 70% em comparação ao placebo.

“Ainda que existam desafios atrelados à infusão do medicamento na janela terapêutica prevista, a empresa compreende que existem soluções possíveis que viabilizem o tratamento”, aponta.

Ao aprovar o uso emergencial do medicamento, a Anvisa já havia informado que o parecer sobre a inclusão no SUS caberia ao Ministério da Saúde.

Até o momento, três medicamentos já tiveram uso emergencial ou registro aprovado pela agência para uso contra a Covid. Além do Regn-Cov-2, a agência deu aval ao Remdesivir, que também é alvo de análise da Conitec na diretriz de pacientes hospitalizados.

Relatório inicial sugeriu que ele não seja usado, parecer que entra como um patamar mais baixo em relação à recomendação. O documento aponta que “algum benefício marginal” pode ser obtido com o uso de Remdesivir, “contudo seu alto custo, baixa experiência de uso e incertezas em relação à efetividade não justificam seu uso de rotina”.

Já o coquetel de anticorpos contra a Covid formado pela associação de banlanivimabe e etesevimabe e desenvolvido pela empresa Eli Lilly, ainda não foi enviado para análise da Conitec.