Recusa de possível pedido de prisão de Robinho pode indispor relações entre Brasil e Itália

“Desde 2017, temos a Lei de Imigração, nº 13.445, que estabelece um novo instituto sobre a transferência de execução de pena. Nesta situação, o governo estrangeiro pode pedir ao governo brasileiro que o condenado cumpra a pena no Brasil, mas existem alguns requisitos”, explicou a especialista.

Para que o pedido de transferência de pena seja viabilizado é necessário que o condenado tenha nacionalidade brasileira e resida no Brasil; que a sentença penal já tenha transitado em julgado; que a pena a ser cumprida seja superior a um ano e; que o delito seja considerado crime tanto no país onde houve o delito quanto no território que receberá o requerimento. A situação do jogador se encaixa em todos estes fatores.

Segundo a advogada ouvida pela Banda B, o pedido de transferência de execução de pena é considerada uma medida de cooperação jurídica internacional.

“A postura do Brasil ao não acatar o pedido seria uma postura não cooperativa. Isso pode gerar um tipo de indisposição de natureza política ou eventualmente até o acionamento de medidas internacionais”, assegurou, ao citar outros casos semelhantes, como o de Cesare Battisti.

Embora ocorra o pedido da Itália para a transferência de pena, os advogados do jogador acreditam ser quase impossível que, se mantida a pena, Robinho seja obrigado a cumprir a sentença no Brasil.

Se Robinho viajar a países que possuem acordo de extradição com a Itália, no entanto, ele poderá ser preso e até deportado ao país italiano para cumprimento da pena.

“Ele ficou com a circulação internacional bem comprometida”, concluiu Hastreiter.

Robinho é condenado por estupro coletivo

A Corte de Cassação da Itália, última instância do judiciário do país europeu, rejeitou o recurso apresentado pela defesa do jogador Robinho, de 37 anos, e confirmou nesta quarta-feira (19) a condenação a nove anos de prisão por estupro coletivo. Por ser uma sentença definitiva, não cabe mais recurso.

O crime ocorreu na Sio Café, em uma boate de Milão, na Itália, em janeiro de 2013 contra uma jovem albanesa de 23 anos. Além do jogador, Ricardo Falco – que também foi condenado – e outros quatro brasileiros participaram da violência sexual.

Quatro dos investigados deixaram a Itália durante a investigação e não foram acusados, porém foram citados nos autos. Portanto, o caso contra o quarteto segue suspenso, mas pode ser reaberto.

Foto: Ivan Storti/Santos/Divulgação

Robinho admitiu que manteve relações sexuais com a vítima, mas negou as acusações de estupro. Ele não compareceu às audiências.

Conversas interceptadas pela polícia que vieram à público indicam que o jogador e os amigos zombaram da vítima.

“Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”, escreveu Robinho durante conversas.

O advogado da vítima,? Jacopo Gnocchi, comemorou a decisão da Justiça italiana e disse que a responsabilidade está nass mãos do Brasil.

“Acredito que o Brasil é um grande país. Não pode proteger culpados, tem que proteger as vítimas. O processo concedeu, do começo ao fim, todos os direitos de defesa para quem foi julgado culpado. Foram 15 juízes, desde a investigação até hoje, que consideraram culpados esses dois”, disse Gnocchi.

Caso Cesare Battisti

O caso que envolve o jogador Robinho trás também à tona a prisão de Cesare Battisti, ex-membro do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), e revela um cenário emblemático sobre a relação entre o Brasil e a Itália.

Battisti foi condenado à prisão perpétua por quatro homicídios ocorridos entre 1977 e 1979 e passou cerca de 40 anos fugindo da Justiça italiana. Ele passou pelo México, França e Brasil.

Em 2004, Cesare chegou ao Brasil, durante o governo Lula (2003 – 2010), onde conseguiu asilo. Em 2010, porém, a Itália pediu a extradição do ex-membro do PAC e o STF (Superior Tribunal Federal) acatou o pedido. Apesar disso, Lula negou a extradição em seu último dia de mandato, no dia 31 de dezembro de 2010.

Cesare Battisti escoltado após desembarcar de avião que o trouxe da Bolívia até a Itália – Foto: Alberto Pizzoli / AFP

A Itália condenou a posição brasileira ao conceder refúgio e pressionou o governo. A Itália chegou a ameaçar boicotar eventos esportivos no Brasil.

Após ser preso pela Polícia Federal em 2017, ao tentar cruzar a fronteira entre o Brasil e a Bolívia com mais de R$ 23 mil, o então presidente Michel Temer decidiu extraditar Battisti. À época, o então ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse que o italiano quebrou a confiança do Brasil.

Temer escolheu esperar o STF decidir sobre um habeas corpus preventivo a ele e, em seguida, o ministro do Supremo Luiz Fux concedeu a liminar que impediu a extradição de Battisti até que o habeas corpus fosse analisado pela 1ª Turma da corte.

Em 2018, porém, a Procuradoria pediu a prisão do italiano, mas ele fugiu. No mesmo ano, Jair Bolsonaro, já eleito presidente da República, se comprometeu a extraditar o italiano. Em 2019, Cesare confessou os crimes pela primeira vez e foi entregue à Itália depois de ser preso em janeiro daquele ano, na Bolívia.

Três anos mais tarde, em 2021, Lula pediu desculpas ao povo italiano e disse que errou ao optar por não extraditar Cesare Battisti.

“Peço desculpas ao povo italiano. Pensei que ele não era culpado, mas depois de sua confissão, só posso me desculpar”, afirmou Lula.