Nos seis anos da Lava Jato, Dallagnol critica Congresso e STF: "combate à corrupção é mais difícil hoje"

Nos seis anos da Lava Jato, Dallagnol critica Congresso e STF:

Durante o seis anos da Lava Jato, ao todo foram realizadas 70 fases, 1.343 buscas e apreensões, 130 prisões preventivas, 163 prisões temporárias, 118 denúncias, 500 pessoas acusadas, 52 sentenças e 253 condenações (165 nomes únicos) a 2.286 anos e 7 meses de pena. Também foram propostas um total de 38 ações civis públicas, sendo o recorde delas em 2019 (12), incluindo ações de improbidade administrativa contra 3 partidos (PSB, MDB e PP).

Mais de R$ 4 bilhões já foram devolvidos por meio de 185 acordos de colaboração e 14 acordos de leniência, nos quais se ajustou a devolução de cerca de R$ 14,3 bilhões.

Do valor recuperado, R$ 3.023.990.764,92 foram destinados à Petrobras, R$ 416.523.412,77 aos cofres da União e R$ 59 milhões para a 11ª Vara da Seção Judiciária de Goiás – decorrente da operação que envolveu a Valec. Também já reverteram em favor da sociedade R$ 570 milhões utilizados para subsidiar a redução dos pedágios no Paraná.

Críticas ao STF e ao Congresso

Decisões e posições do STF e do Congresso no ano passado foram alvos de críticas do coordenador da operação, pois segundo ele dificultaram o trabalho da força-tarefa. Um das decisões lembradas por Dallagnol aconteceu em novembro, quando o Supremo voltou atrás sobre a prisão após condenação em segunda instância.

"A partir disso, casos criminas especialmente contra réus de colarinho branco vão demorar muitos anos mais, aumentando as chances de prescrição e consequentemente de impunidade", disse o procurador da República.

Outra decisão mencionada, foi a aprovação do pacote anticrime em dezembro. "Ao longo da tramitação no Congresso, o projeto teve uma série de mudanças que suprimiram regras contra a corrupção e enxertaram outras que tornam prisões preventivas mais difíceis, além de dificultarem colaborações premiadas", continuou Dallagnol.

Também foram citadas a aprovação da lei de Abuso de Autoridade, que começou a valer em janeiro. No ano passado, o STF tomou ainda outras decisões que afetaram investigações e processos: a transferência dos casos de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro investigados em conexão com crimes eleitorais (caixa 2), da Justiça Federal para a Eleitoral e a possibilidade de anular casos em que corréus delatados não tiveram oportunidade de se manifestar depois dos delatores, o que levou à anulação, inclusive, de sentença condenatória de uma ação civil pública de improbidade administrativa proposta pela força-tarefa em 2015 e que previa o pagamento de indenização de mais de R$ 380 milhões.

Após listar as decisões, Dallagnol concluiu que o ambiente de combate à corrupção hoje é mais difícil do que quando a operação começou: "Depois de 6 anos de Lava Jato, temos um ambiente de combate à corrupção mais difícil do que nós tínhamos no início da Lava Jato".

Volume de trabalho crescente

Ao longo de sua existência, o volume do trabalho da força-tarefa cresceu significativamente. O número de manifestações judiciais, ou seja, atos praticados dentro de processos perante a Justiça Federal, como petição e parecer, quase dobrou de 2018 para 2019: de 4.461 para 8.252.

Só em 2019, foram registrados 68.730 atos na força-tarefa em Curitiba, incluindo manifestações, movimentações, autuações de documentos extrajudiciais e judiciais, pedidos de cooperação internacional e instauração de procedimentos extrajudiciais, autos judiciais e inquéritos, um crescimento de mais de 1.200% do volume anual de trabalho desde 2014, ano do início do caso.

O ano de 2019 também foi aquele em que houve a instauração de 864 novos autos judiciais, o maior número desde o início da operação. O dado se refere, por exemplo, a novos inquéritos, pedidos de quebras de sigilo ou busca e apreensão, ações penais, pedidos de bloqueio e exceções de incompetência.

A quantidade anual de autos extrajudiciais instaurados em 2019 foi a segunda maior na Lava Jato. Foram 377 novos autos, que incluem, ilustrativamente, procedimentos de investigação criminal, inquéritos civis e procedimentos de acompanhamento da celebração de acordos.

O trabalho da força-tarefa de procuradores regionais que atuam perante o Tribunal Regional Federal da 4ª região (TRF4) também aumentou. O número de feitos que passaram pela procuradoria regional saltou de 155 em 2018 para 252 em 2019, ano recorde também no tocante a esse tipo de movimentação.

"Os dados demonstram que a operação está em pleno andamento, sendo que a atuação da força-tarefa junto ao TRF4 teve aumento expressivo no último ano de 2019, com desdobramentos das fases iniciais e novos focos de corrupção descobertos nesses anos", afirma a coordenadora da força-tarefa da Procuradoria Regional da República da 4ª região (PRR4) Maria Emília Corrêa da Costa Dick.

Incremento de medidas investigativas em 2019

O último ano da força-tarefa se destacou também pelo incremento de uma série de medidas investigativas, algumas delas responsáveis por diferenciar o trabalho da Lava Jato. Essas medidas repercutiram, em parte, nos resultados alcançados no ano anterior e seus resultados seguirão se desdobrando nos próximos meses.

O ano de 2019 foi aquele em que ocorreu a coleta de um maior número de depoimentos pelos procuradores, num total de 206, o que é uma técnica tradicional de apuração de crimes – o número não inclui aqueles colhidos pela polícia federal.

Dentre os acordos, que têm função principal de expandir as investigações, destacou-se a celebração em 2019 de 4 acordos de leniência, número que empatou com aquele dos pactos de 2016, superando os demais anos da operação.

Entre 2014 e 2019, a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF homologou 31 acordos de leniência, sendo 14 celebrados pela força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Segundo a coordenadora da 5ª CCR Maria Iraneide Olinda Santoro Facchini: "Os acordos de leniência firmados pelo MPF já permitiram a recuperação, entre multa e ressarcimento de dano, de mais de R$ 22 bilhões, sendo que os valores decorrentes dos acordos celebrados pela operação no Paraná superam os R$ 14 bilhões".

Outra ferramenta de investigação central da Lava Jato foram os pedidos de cooperação internacional, tema em que o ano de 2019 também bateu recorde. Foram 189 os pedidos remetidos ou recebidos pelos procuradores da força-tarefa.

Dezenas de "terabyte" de informações foram obtidas para fins de investigação. Dentre os dados, destacam-se os bancários, os telefônicos, os telemáticos e aqueles encaminhados pelo Coaf.

No ano de 2019 apenas, foram apresentadas 247 pedidos medidas cautelares, boa parte com o propósito de obter autorização judicial para acesso a dados sigiloso de investigados, número inferior apenas ao do ano de 2015. Houve 21 casos de quebra de sigilo telefônico de diversos terminais.

A Lava Jato foi responsável, ao longo dos seis anos, por inserir mais de R$ 3,8 trilhões no Sistema de Movimentação Bancária (Simba) – sistema criado pelo MPF em 2007 que padroniza as informações fornecidas por instituições financeiras e agiliza a análise desses dados, muitos oriundos de quebras de sigilo bancário e disponíveis para serem compartilhados com outros órgãos – quase 20% do total da história de todo o MPF.

Tais dados se somaram àqueles recebidos do Coaf, que enviou para a Lava Jato 693 Relatórios de Informação Financeira.

Todas essas informações foram usadas por analistas do MPF para produzir 1.356 relatórios de análise e investigação apenas na força-tarefa em Curitiba.

"Após cinco anos de existência, a força-tarefa da operação Lava Jato do Ministério Público Federal no Paraná (MPF/PR) continua a apresentar números recordes em termos de medidas de investigação e resultados. Em 2019 houve o maior número de cooperações internacionais, de depoimentos colhidos por procuradores, de manifestações judiciais, de ações civis públicas, de recursos para cortes superiores e de acordos de leniência. Isso já resultou ainda em 2019 no maior número de denúncias e na maior recuperação de valores nos seis anos da operação, e o trabalho continua", afirmou o procurador Júlio Noronha, um dos coordenadores dos trabalhos da força-tarefa em Curitiba.