Com Estado em colapso, milionários de MT com covid-19 recorrem a jatinhos para buscar tratamento
Assim como Botelho, o presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT), Guilherme Maluf, que é ex-deputado estadual, também alugou um avião para se tratar em um hospital particular de São Paulo, após ser diagnosticado com a covid-19.
Milionários, Botelho e Maluf não pensaram duas vezes antes de viajar para São Paulo. Os dois constataram que teriam melhor atendimento longe do próprio Estado no qual são figuras conhecidas da política — Maluf é ex-presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso e se tornou conselheiro do TCE-MT em razão de seu cargo como deputado estadual.
Além da carreira política, Botelho e Maluf têm outra característica em comum: são alvos de diferentes investigações sobre fraudes contra os cofres públicos de Mato Grosso. Os dois negam qualquer irregularidade.
Maluf e Botelho ilustram uma realidade social da covid-19: os ricos são os menos afetados duramente pelo novo coronavírus.
Em Mato Grosso havia, na semana passada, 37 pedidos de leitos de UTI para pacientes com a covid-19. Apesar das solicitações, porém, pouco podia ser feito sobre o assunto. Isso porque há poucos leitos disponíveis — muitas vezes, quando um é desocupado, logo há um paciente grave à espera. Nos Estados vizinhos, a situação não é muito diferente, o que dificulta a intenção do governo de transferir doentes para outras regiões.
Em Mato Grosso já foram registradas mais de 1,2 mil mortes pelo novo coronavírus e 31,1 mil pessoas foram infectadas, segundo dados atuais do Ministério da Saúde. O Estado, que figurava entre aqueles com menos casos no país, agora está entre as regiões com os maiores índices de crescimento de registros de covid-19.
Milionários em SP
Guilherme Maluf, de 56 anos, foi diagnosticado com a covid-19 no último fim de semana, após apresentar sintomas como tosse e febre. Diante da falta de UTI no Estado, alugou um avião e seguiu, junto com a esposa, para o hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo.
De acordo com a assessoria de imprensa de Maluf, mesmo sem sintomas graves, ele viajou para São Paulo como forma de precaução, caso os sintomas piorassem e precisasse de uma UTI. O quadro de saúde de Maluf é considerado estável.
Ainda segundo a assessoria de imprensa, o avião foi fretado por Maluf com recursos próprios. Os custos da internação dele no hospital, também conforme a assessoria, são cobertos pelo plano de saúde que possui.
Assim como Maluf, o deputado estadual Eduardo Botelho, de 61 anos, também decidiu viajar para São Paulo por medo de precisar de uma UTI. "O avanço (da doença) foi muito rápido", disse o presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso em um vídeo publicado em suas redes sociais.
"Fui informado que se eu continuasse evoluindo assim, poderia precisar de UTI. Com o sistema totalmente colapsado de UTI (em Mato Grosso), eu tinha 50% de chance de precisar de uma já na noite de segunda-feira. 50% é um número bom para jogar na loteria, mas para jogar com a vida não é", declarou Botelho, ao justificar a ida para São Paulo.
A assessoria de imprensa de Botelho afirma que o deputado utilizou recursos próprios para viajar a São Paulo. A reportagem não obteve respostas se o deputado está pagando o hospital de modo particular ou se o plano de saúde dele cobre a internação.
No vídeo publicado nas redes, Botelho disse que foi encaminhado a uma unidade semi-intensiva logo que chegou ao Sírio Libanês, onde permanece. "Realmente precisei de oxigênio", comentou. O parlamentar afirmou que teve 50% dos pulmões comprometidos pela doença. O quadro de saúde dele é considerado estável.
As UTIs em Mato Grosso
Enquanto Maluf e Botelho recebem tratamentos em unidades de São Paulo, a população mato-grossense enfrenta a pior situação na saúde desde o início da pandemia do novo coronavírus.
A Secretaria de Saúde do Estado afirma que 93,1% dos 275 leitos de UTI destinados a pacientes com a covid-19 estão ocupados. O Governo de Mato Grosso declara que tem trabalhado com urgência para ativar mais 204 leitos de UTI para pacientes com o novo coronavírus.
A falta de UTIs no Estado preocupa o promotor de Justiça Alexandre Guedes, da Área de Cidadania e Saúde Pública de Cuiabá. Ele afirma que, apesar de o governo de Mato Grosso apontar que quase 7% dos leitos de UTI estão disponíveis, na prática não há vagas. "Essa pequena porcentagem que sobra é referente ao período em que um paciente sai e logo entra outro no leito. Não há mais vaga em nenhum lugar, por isso há dezenas de liminares solicitando UTIs", diz.
"Antes da pandemia, já faltava vaga na rede pública. Mas o Estado podia mandar o paciente para a rede privada. Agora, nem isso pode ser feito mais, porque não há vaga em nenhum lugar", acrescenta Guedes.
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