"A descoberta que me confortou após perder meu filho médico, aos 26 anos, para a covid-19

 

Ao longo do curso de medicina, na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), ele costumava dizer à família que havia se encontrado. "O meu filho não tinha dúvidas de que era aquilo que ele queria fazer por toda a vida", diz a professora Regiane Marçal Moreno da Cunha, mãe de Fernando.

Após concluir o curso, em outubro de 2018, o jovem trabalhou em hospitais públicos e particulares em Cuiabá e outros municípios mato-grossenses. O médico, que nasceu em Cianorte (PR), morava em Mato Grosso desde a adolescência.

Durante a pandemia de covid-19, ele se mostrou extremamente preocupado com a situação. No período, trabalhou arduamente. Ao contrair o coronavírus, não resistiu. Morreu em julho, aos 26 anos.

O jovem se tornou uma das vítimas do vírus, que até o momento matou mais de 115 mil pessoas no país. Conforme o Ministério da Saúde, 189 médicos que estavam na linha de frente do combate ao coronavírus morreram de covid-19 no país entre março e julho.

Em meio à dor, Regiane revela ter feito uma descoberta que a confortou: a conduta humanizada de Fernando como médico. Ela conta que a família recebeu mensagens de conforto e relatos de pessoas que foram atendidas pelo jovem e elogiaram a postura dele.

"Eu sabia que o meu filho era um bom médico, mas não imaginava que ele fosse um profissional tão humano. Descobrir o carinho que as pessoas tinham por ele foi muito importante pra mim", revela a mãe dele à BBC News Brasil.

O sonho de ser médico

Fernando era considerado um bom aluno desde a infância. "Ele tinha um método diferente dos outros. Enquanto os amigos precisavam estudar um mês para as provas, ele revisava o conteúdo no dia anterior e conseguia tirar boas notas", diz Regiane. Ela conta que os professores do filho sempre elogiavam o bom desempenho dele nas aulas.

Além do foco nos estudos, o médico também era apaixonado por pescaria, games e música. "Ele era autodidata. Aprendeu a tocar guitarra e violão sozinho", revela a mãe.

Após concluir o Ensino Médio, Fernando ficou em dúvida entre Medicina e Engenharia Nuclear. "Ele passou em cinco universidades públicas. No fim, decidiu ficar em Cuiabá para estudar Medicina, que era realmente o sonho dele", relata a mãe.

Na universidade, o jovem se destacava na turma pela altura — ele tinha 1,98m —, pela simpatia e pela dedicação aos estudos. Gurja, como os amigos costumavam chamá-lo, era definido como um profissional extremamente apaixonado pela Medicina.

Com menos de dois anos de formado, enfrentou o maior desafio da carreira: o combate à covid-19. Preocupado com a mãe e com o padrasto, ele avisou que só veria a família quando a pandemia acabasse. "A última vez em que nos vimos foi em março. Morávamos perto. Eu o chamei algumas vezes para ir à minha casa, mas ele dizia que não podia, porque tinha medo de passar o vírus para mim ou para o meu marido (padrasto de Fernando)", relata Regiane.

Diariamente, ele falava por meio do WhatsApp com a mãe, em Cuiabá, e com o pai, que mora em Cianorte.

A preocupação de Fernando com o trabalho se tornou ainda maior durante a pandemia. "Ele passava o dia preocupado com os pacientes com a covid-19, tinha medo de faltar equipamentos de ventilação mecânica ou leitos", conta a mãe do médico.

Após meses no enfrentamento à pandemia, ele foi infectado pelo novo coronavírus. "Em 28 de junho, o meu filho me mandou um áudio em que disse, tranquilo, que estava com a covid-19. Ele ficou isolado em casa e pegou afastamento do trabalho por 14 dias. Ele estava muito calmo e aquilo me passou tranquilidade. Não achei que a situação dele fosse se complicar", diz Regiane.

A covid-19

Três dias após ser diagnosticado com a covid-19, Fernando piorou. Ele foi ao hospital e descobriu que havia comprometimento de 50% de seus pulmões.

"Ele me mandou uma mensagem dizendo que os médicos acharam melhor que ele ficasse no hospital, para ter uma estrutura melhor, mas não era nada grave", relembra a mãe. Dois dias depois, a situação do médico piorou ainda mais, ele foi intubado e levado para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI). "Foi tudo muito rápido. Isso me deixa revoltada. É muito triste", lamenta Regiane.

A mãe conta que não sabia que a obesidade de Fernando poderia ser um fator de risco — estudos apontam que a obesidade aumenta as chances de um jovem desenvolver quadro grave de covid-19. "O meu filho havia engordado muito durante a pandemia, talvez por ansiedade e estresse, e isso pode ter piorado a situação. Só descobri que o peso poderia ser um risco depois da morte dele. Ele nunca me disse isso, provavelmente para não me deixar mais preocupada", relata.

Após mais de duas semanas intubado, Fernando não resistiu. Ele morreu em 18 de julho. "Quando atendi à ligação e recebi a notícia, gritei muito. Minha filha e meu marido foram muito fortes e seguraram a barra, porque eu fiquei totalmente desesperada", diz.

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