Postura do governo contribui para relação "não muito boa" com China e Índia, diz professora de direito internacional

Postura do governo contribui para relação

Com a China, a negociação chegou até mesmo a envolver outros personagens, como é o caso do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), e do governador de São Paulo, João Dória (PSDB).

Para a professora de direito internacional do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba), Michele Hastreiter, a postura do governo Jair Bolsonaro certamente contribui para essa dificuldade de negociação. “A gente pode perceber, inclusive em declarações polêmicas de membros do governo e pessoas da família do presidente tiveram, que contribuem para essa relação não muito boa com a China e com a Índia, que são os dois países de principal interesse nesse momento. A gente depende da importação de insumos chineses para a produção das vacinas no Brasil, mas tivemos várias polêmicas do governo Bolsonaro com a China, tanto de acusação de que a pandemia teria sido causada de propósito, como declarações até mesmo racistas do ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, bem como do filho do presidente Eduardo Bolsonaro, que caíram mal com os chineses”, explica.

Em abril do ano passado, Weintraub fez insinuações de que a China poderia se beneficiar, de propósito, da crise causada pelo coronavírus. O texto imitava a fala do personagem Cebolinha, da Turma da Mônica, que, ao falar, troca a letra “R” pela “L”, num sinal de ridicularizarão aos chineses. Já Eduardo Bolsonaro adotou a expressão “vírus chinês” ao fazer insinuações contra o país asiático.

Brics

Quando falamos da relação entre Brasil, China e Índia, também é inevitável lembrar do Brics, que é o agrupamento dos países com África do Sul e Rússia. Desde 2009, os países mantêm uma cooperação próxima que visa o desenvolvimento econômico.

Desde o ano passado, porém, as relações da Índia parecem não ser as mesmas. Em uma posição alinhada com Donald Trump, o Brasil se posicionou contra a proposta indiana na Organização Mundial do Comércio (OMC) para que fosse permitido às nações suspender patentes e outros instrumentos de propriedade intelectual que fossem vinculados ao combate à pandemia de Covid-19.

Segundo Hastreiter, a medida é incoerente com a postura histórica do Brasil. “Isso tem sido apontado hoje como um dos motivos pelo qual a Índia não priorizou o nosso país como um país para receber as doses, então é um resultado da mudança de alinhamento”, diz.

Estados Unidos

Por fim, é importante lembrar da troca de governo nos Estados Unidos. Já no anúncio da posse, nesta quarta-feira (20), o presidente Joe Biden anunciou medidas que contrariam atos conjuntos do Brasil com Donald Trump.

De acordo com a professora do Unicuritiba, é importante que o Brasil baixe o tom nesse momento. “De fato pode ser um preço caro por esse alinhamento à pessoa de Donald Trump, a qual Bolsonaro declarou amor literalmente, uma vez que ele não é mais o presidente dos Estados Unidos. Joe Biden assume já desfazendo uma série de questões extremamente polêmicas com as quais o Brasil se posicionou ao lado de Trump, mostrando que a agenda externa por lá vai mudar. Então, vamos ter que ver se iremos recuar nessa agenda de um conservadorismo, contra o multilateralismo e contra e o meio ambiente, ou se vamos continuar insistindo na tecla, mas sem um aliado muito importante, que são os Estados Unidos”, conclui.

Ainda na quarta-feira, Bolsonaro endereçou uma carta a Joe Biden com a intenção de manter boas relações com os Estados Unidos.