Cadernos desaparecidos de Darwin são recuperados após 22 anos

Cadernos desaparecidos de Darwin são recuperados após 22 anos

Gardner ainda precisou esperar cinco dias pela permissão da polícia para retirar o plástico e confirmar que aqueles eram mesmo os blocos de notas originais. Ainda não há pistas sobre a identidade do ladrão, mas os documentos estão em bom estado, segundo a equipe de Cambridge.

Apelidados por Darwin de cadernos sobre “transmutação” (o termo “evolução” ainda não era empregado no sentido que ganharia entre os biólogos), os manuscritos datam dos anos de 1837 e 1838, pouco depois da viagem do naturalista pelo mundo a bordo do navio HMS Beagle.

As observações de Darwin durante a jornada, mapeando fósseis e animais nativos de locais como o Brasil, os pampas da Argentina e as ilhas Galápagos, no Pacífico, estimularam o jovem pesquisador a formular explicações para o surgimento das espécies mundo afora.

É nesse contexto que, praticamente pensando no papel, ele esboçou no “Caderno B” um diagrama que acabaria se tornando um dos ícones da biologia evolucionista. No alto da página, Darwin escreveu simplesmente “I think” (“Eu acho”) e, embaixo, uma estrutura semelhante ao tronco e aos galhos de uma árvore em constante ramificação, cujas pontas corresponderiam às espécies atuais, unidas no passado por ancestrais comuns.

“A árvore da vida talvez devesse ser chamada de coral da vida, [pois a] base dos ramos está morta”, escreveu ele então, fazendo referência ao fato de que os corais, conforme crescem, apoiam-se em esqueletos calcários que vão formando os recifes.

O “Caderno B”, de capa vermelha, revela também a influência do avô do naturalista, Erasmus Darwin, que havia especulado sobre a evolução dos seres vivos no século 18 -no começo das anotações Darwin colocou o título “Zoönomia”, nome de uma das obras de Erasmus.

Os textos do manuscrito mostram ainda a busca de uma conciliação entre as ideias de transmutação das espécies ao longo do tempo e a ação de Deus -na época, Darwin se considerava cristão e ainda não se tornara agnóstico.

Para ele, a evolução permitiria que o Criador agisse de forma indireta sobre os seres vivos, estabelecendo leis naturais que levariam ao surgimento de novas espécies, um método que, para Darwin, seria “muito mais simples & mais sublime” do que a criação direta e instantânea dos seres vivos.

Ele também observa, no mesmo caderno, que o orgulho humano era um obstáculo ao reconhecimento da origem em comum com os animais. “Aos animais, a quem fizemos nossos escravos, não nos apraz considerar nossos iguais”, escreve ele.

No “Caderno C”, Darwin amplia algumas dessas observações, ao mesmo tempo em que revela os preconceitos raciais de sua época, ao falar da semelhança entre os grandes símios e os seres humanos considerados “primitivos”.

“Que o homem visite o orangotango domesticado, ouça seus lamentos expressivos, veja a sua inteligência, depois observe o selvagem, nu, sem artes, sem melhoramentos, mas capaz de ser melhorado & ele que ouse se vangloriar da sua proeminência orgulhosa”, comenta ele.