Zelenski vê "inferno" com avanço da Rússia no leste da Ucrânia

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Na noite de quinta (19), o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, sinalizou concordar. Ele afirmou que os russos transformaram o Donbass em um “inferno” e que a situação na região é bastante grave.

O governo da parte de Lugansk ainda sob controle ucraniano afirmou que 11 mil edifícios em todo o leste foram destruídos nas últimas semanas. “No Donbass, os ocupantes estão tentando aumentar a pressão. Está um inferno, e isso não é um exagero”, disse em seu pronunciamento noturno de praxe.

A impaciência em Kiev dá sinais de que o triunfalismo no Ocidente com a retirada das forças de Putin da região de Kharkiv, segunda maior cidade ucraniana, pode ter sido exagerado. Por um lado, a saída explicitou a dificuldade dos russos de manter vários focos na guerra, por falta de recursos humanos já que não há uma mobilização nacional.

Isso já havia custado a retirada de toda a região em torno de Kiev e de outras áreas no noroeste do país, numa humilhação militar para o Kremlin. Mas tudo indica que os soldados que estavam em Kharkiv agora trabalham concentrados no Donbass, mais a sudeste daquela cidade, e isso talvez lhes dê a vitória pontual.

Se completar a conquista de Lugansk, ficará faltando a Moscou lidar com as tropas de Kiev ainda em Donetsk, centradas na capital administrativa não ocupada de Kramatorsk. A ideia inicial dos russos, segundo analistas militares, era cercar todas as forças ao mesmo tempo, mas a falta de soldados impediu, obrigando o fatiamento da ofensiva.

Segundo um analista militar moscovita, que pediu para não ser identificado devido ao clima repressivo na Rússia, esse avanço poderá ajudar Putin a ter um discurso de vitória à mão, ainda que parcial, já que o rascunho inicial da invasão parecia pressupor a derrubada total do governo de Zelenski.

Ele afirmou, contudo, que isso não está garantido, já que o poderio militar de Kiev em Donetsk é maior do que em Lugansk. Além disso, ninguém tem ideia do que Putin deseja de fato: se abocanhar o Donbass, terá um território que liga a região à Crimeia, anexada sem um tiro em 2014, sob seu controle. O fim da resistência simbólica em Mariupol, nesta semana, cristalizou o desenho.

Não se sabe se ele pararia aí ou avançaria para tentar tomar a costa do mar Negro, e também nada garante o fim da guerra que está quase completando seu terceiro mês. Kiev também diz que não aceitará um status quo com perda de território, o que pode levar a um congelamento do conflito nas linhas do que aconteceu no Donbass nos últimos oito anos.

Enquanto isso, os sinais de nervosismo ucraniano vão além da fala de Zelenski. Também na quinta, num evento virtual para arrecadar fundos, o chanceler Dmitro Kuleba voltou a criticar a Otan, aliança militar liderada pelos EUA que tem sido vital para a resistência de Kiev com o fornecimento de armas e dados de inteligência.

“Vocês poderiam citar ao menos uma decisão de consenso tomada pela Otan nos últimos três meses que tenha ajudado a Ucrânia? A Otan, como instituição, não fez nada durante esse período”, afirmou. Como isso foi dito na noite em que os EUA aprovaram um megapacote de US$ 40 bilhões (quase R$ 200 bilhões) em ajuda a Kiev, Kuleba ainda tentou dourar a pílula dizendo que não falava de países individualmente.

Mas prosseguiu na crítica, comparando a Otan à União Europeia (UE), ambas estruturas cujo desejo ucraniano de integrar foi central para a agressão de Putin, que não tolera a ideia de ter forças ocidentais junto à sua maior fronteira a oeste. “A União Europeia provou ser uma organização capaz de atuar como uma frente unida e de tomar posições poderosas, importantes e difíceis -ao contrário da Otan.”

A Rússia diz que uma das condições para o fim da guerra é a neutralidade de Kiev ante ambas as instituições. Nesta semana, Putin colheu o oposto na Suécia e na Finlândia, que já são da UE e pediram para entrar na Otan, embora haja resistência da Turquia, que é membro da aliança, mas mantém boas relações com o Kremlin.