Padre é afastado após abençoar cerimônia comunitária com casais gays em SP

Padre é afastado após abençoar cerimônia comunitária com casais gays em SP

Em outro trecho, há a afirmação de que a cerimônia teve a presença de casais impedidos de contrair o matrimônio católico por causa de “vínculos anteriores, além de três casais homoafetivos”.

O casamento comunitário foi organizado pela Prefeitura de Franco da Rocha em um ginásio de esportes. Foi a 15ª edição desse tipo de evento na cidade. Além de oficializarem as uniões civis, os casais receberam uma bênção inter-religiosa. Estavam presentes o padre Assis, a yalorixá Tania ti Oyá, o pastor Sérgio Cunha e o kardecista José Lúcio Arantes.

Segundo Assis, o fato de ter abençoado três casais homoafetivos gerou reclamações à cúpula da igreja, como se ele tivesse celebrado um casamento gay. “Só fiz uma bênção. Como benzo cachorro, benzo gato, benzo carro. Então eu benzi pessoas”, diz o religioso.

Após uma conversa com Dom Odilo, ele foi suspenso. Antes de viajar para Cabo Verde, onde ficará de férias até março, o padre escreveu uma carta de agradecimento pela solidariedade recebida e deixou claro o que pensa sobre a punição.

“Estamos discutindo uma coisa bem séria, pois podemos ordenar pessoas homoafetivas, mas não podemos abençoá-las”, afirmou no texto. “Eu, nos meus 20 e poucos anos de caminhada, conheci seminaristas, padres, bispos e cardeais homoafetivos. Via e vejo pessoas que amam, que se dedicam, que se doam totalmente em prol do reino de Deus. Se amanhã quiserem construir famílias e ter uma relação assumida, não terão direito a uma bênção oficial da madre Igreja Católica Apostólica Romana”.

O religioso escreveu também que prefere contar aos sobrinhos que foi suspenso por benzer pessoas do que por roubar a igreja, ser acusado de pedofilia, ter engravidado alguém ou separado famílias.

Desde que a punição foi divulgada, no final de novembro, ele recebe a solidariedade de moradores da Vila Prudente. A casa paroquial, que está prestes a deixar, está sempre cheia de amigos que o religioso conquistou desde que chegou ao bairro, em 2013.

A carta aberta em protesto contra a punição é assinada pelas comunidades católicas São José Operário (favela da Vila Prudente), Nossa Senhora Aparecida (favela Jacaraípe), São Francisco de Assis (favela Ilha das Cobras), Nossa Senhora das Graças (favela Haiti) e Santa Terezinha do Menino Jesus (favela da Sabesp).

Padre Assis faz parte da Congregação Missionários do Espírito Santo. Antes de São Paulo, já viveu em Lisboa, Tefé (no Amazonas) e em Paris. Foi para a Vila Prudente auxiliar o padre Patrick Clarke, missionário irlandês e um dos fundadores do Movimento de Defesa do Favelado.

Ele tinha “uso de ordem” da Arquidiocese de São Paulo, uma permissão para exercer as funções religiosas na cidade, e que agora foi retirada.

Nas comunidades da zona leste, os missionários atuam em uma creche, em um centro cultural que oferece aulas para as crianças da região e em um centro de reciclagem.

Padre Assis costuma dizer que o Jesus dele “é black, cola com os manos, pisa nos becos e nas vielas”. Em entrevista recente ao músico João Gordo, contou que perdeu as contas de quantas vezes foi parado pela polícia e chamado de maconheiro antes de se identificar como padre. “Acho que minha pele incomoda”.

Segundo a Arquidiocese de São Paulo, a medida cautelar aplicada no caso está prevista nas normas da Igreja Católica quando há uma irregularidade grave do ponto de vista religioso.

A instituição explica que o que causou a medida foi o possível delito canônico de “simulação” de um casamento, pois não houve o encaminhamento da celebração das uniões e não foi realizado o processo matrimonial, como determinam as normas eclesiásticas.

Em nota, a arquidiocese afirmou que o padre não poderia celebrar sem a autorização do bispo ou do pároco local. Também não poderia fazer a celebração junto com representantes de outras religiões sem receber uma “dispensa” para isso.

“Tratava-se de uma cerimônia coletiva de casamento civil e não de uma simples bênção. As pessoas que estavam lá desejavam se casar e não apenas receber uma bênção”, diz a nota.

Segundo a igreja, a retirada da ordem ao padre poderá ser revertida após os fatos serem esclarecidos e “a depender da aceitação do sacerdote de observar as normas da igreja”.

A presença de casais homoafetivos não foi citada na nota enviada à reportagem.