Jovem de Santos Dumont é exemplo de superação das adversidades diante das promessas não cumpridas de ano novo

Jovem de Santos Dumont é exemplo de superação das adversidades diante das promessas não cumpridas de ano novo

Eugênio Xavier, portador de uma doença crônica e incapacitante, mostra como aprendeu a viver sem fazer planos. E, para quem se frustrou por entrar em 2020 sem cumprir suas metas, o G1 ouviu especialistas sobre a frustração de não ter fechado seus ciclos. Depois das festas de final de ano, a volta à realidade pode ser complicada para quem se desligou da rotina pesada, mas agora tem a sensação de incompletude, por não conseguir cumprir todas as metas de ano novo, como planejou.

O G1 traz a história de um jovem da cidade de Santos Dumont, na Zona da Mata, protagonista de uma vida de superação, depois que descobriu ser portador de uma doença rara.

Ele coloca em xeque a real importância de cumprir todas as metas estipuladas, como fator determinante para viver uma vida nova, com a chegada do ano novo.

Eugênio Xavier, morador de Santos Dumont tem doença rara conhecida como Esclerodermia

Eugênio Xavier/Arquivo Pessoal

Eugênio Xavier é uma prova de que quando os propósitos não forem cumpridos e os planos não se concretizarem como o esperado, é possível transformar a dor e o sofrimento em aprendizado e estímulo pela busca de dias melhores.

Técnico em mecânica e bacharel em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), ele foi diagnosticado com esclerodermia – uma doença inflamatória crônica do tecido conjuntivo, aos 17 anos.

Naquela época tinha muitos planos e metas definidas.Queria ser professor, levava uma vida normal, frequentava festas, pulava Carnaval, fazia academia, ia a shows musicais.

Mas desde 2013, traçar metas para o futuro passou a ficar um pouco mais difícil. Com o diagnóstico fechado, encaminhado para um reumatologista, ele passou por uma das piores experiências da vida.

"Ouvi do médico que teria cinco anos só de vida, que teria que amputar meu dedo da mão, que o progresso da minha doença era muito complicado. E que também não havia consenso sobre o melhor tratamento. Como assim? Eu estava na faculdade, tocava guitarra e violão, tinha uma banda de rock e muita coisa para fazer. Fiquei sem chão. Pensei em terminar ali mesmo a minha existência. Mas me indicaram um outro médico, que deu um novo olhar para a minha condição de vida", contou

Foram longos anos, muitas felicidades e dificuldades. Eugênio enfrentou um câncer, perdeu o pai, teve que voltar para cidade natal pois já não era mais possível viver em Juiz de Fora por conta da enfermidade, que se desenvolvia trazendo mais limitações.

"Passei a usar sonda gástrica, a alimentação foi ficando cada vez mais restrita, porque desenvolvi diversas intolerâncias alimentares. Hoje, só me alimento com alguns suplementos e dieta caseira. E agora tenho dificuldade para andar, falar e dormir. Mas, sou um cara feliz com o que tenho. E, assim vou caminhando, ajudando e deixando me ajudarem", explicou.

Dono do futuro

Segundo a psicóloga, Patrícia Teixeira Pereira, a angústia faz parte da vida humana.

Arquivo Pessoal/Patrícia Teixeira

O plano de ser dono do futuro e garantir o cumprimento de todas metas nem sempre pode sair como o previsto. E, a sensação angustiante de perceber que não foi possível cumprir todas as metas de fim de ano, segundo a psicóloga Patrícia Teixeira Pereira, faz parte da vida, o que não é exatamente um problema.

"A angústia é da vida humana. E, permitir se angustiar é uma possibilidade de se a ver com a posição que estamos diante daquilo que nos aflige. E assim, buscar saídas criativas para lidar com nossos anseios", completou Patrícia, que também é professora do curso de Psicologia da Faculdade Machado Sobrinho.

"O problema é que vivemos um momento atual marcado pela multiplicidade de bens e objetos, que são subvertidos em uma promessa de satisfação imediata, aliada a garantia de felicidade. Nesse contexto, feliz é aquele que consome e consegue produzir - o relacionamento ideal, o corpo perfeito, o carro do ano ou a viagem dos sonhos," explicou.

Ainda segundo a psicóloga, desta forma é possível perceber um deslocamento do modo como as pessoas se posicionam perante a vida, ficando cada vez mais referidas a um ideal externo e cada vez menos voltadas à reflexão da própria essência.

"Na vida humana, a falta é estrutural, ou seja, é importante que ela exista. Porque é a partir dela que podemos poder dar real valor às coisas e, encontrar um tom criativo para nossa existência. É esta falta que nos move em direção ao nosso desejo."

Para Eugênio, foi a condição da falta de uma vida normal que o curou. "Diante das dificuldades, me tornei um cara melhor, mais simpático, mais ouvinte, mais humano. Eu sei que tenho a mente vivíssima e o corpo fraco. Eu quero fazer muita coisa, mas o corpo não deixa. E não desisto. Estou sempre procurando alternativas. Já consigo tomar um ar sozinho no quintal de casa. Agora a meta é sair sozinho às ruas," afirmou.

E reforça que o segredo é ter consciência de que a vida não é fácil para ninguém. Todo mundo tem problemas, a diferença é a forma como cada um lida com eles.

Sobre planos e metas

Frente à necessidade de se realizar e atingir metas, uma orientação de Patrícia Teixeira é que talvez uma saída não curativa, mas eminentemente terapêutica para esse momento, seja a busca pela fruição com a vida.

Buscar espaços para se interrogar sobre a vida pode ser um bom caminho, tornando-se uma possibilidade de construir ancoragens criativas para a existência. "Não existe uma regra de ouro que se aplique a todos: todo homem tem de descobrir por si mesmo de que modo específico pode ser salvo", orientou.

Em entrevista ao G1, Robson Hamuche que com Tadashi Kadomoto é autor do livro "Um compromisso por dia", explicou que nestes períodos de datas como ano novo, aniversário, consideradas épocas de renascimento, as pessoas tendem a viver a angústia maior porque não conseguiram fechar seus ciclos.

Robson Hamuche

Divulgação

"E sempre que vem o sofrimento, temos nossos pensamentos voltados ou para o passado ou para o futuro. Por isso, é importante, esquecer o que não foi possível conseguir, repensar qual foi o sentimento que nos limitou e viver o presente. Avaliar o que pode ser melhorado e seguir em frente", afirmou.

Reunir pequenas propostas de atitudes mentais, físicas e espirituais para aplicar no próprio cotidiano pode ajudar no desenvolvimento pessoal e, "assim fazer com que os desafios se transformem em ações significativas na vida e no transformem a cada dia. Dessa forma podemos fazer o nosso melhor, encontrar nossa verdadeira essência e sermos felizes", finalizou.

E Eugênio acredita que descobriu o caminho para quando o plano não se concretizar. Pra ele, é importante ser sincero, dizer que ama, quando ama, dizer que sente falta.

"As pessoas se esquecem disso e acham que têm muito tempo. Ficam pensando demais no futuro. Viva o hoje e respeite o tempo. Ele é o senhor de todas as curas. Se algo ainda não aconteceu é porque ainda não é para ser. E, se a gente não sabe se vai ser, o ideal é fazer o que dá, com que se tem nas mãos e, agora. Chore mesmo quando tiver que chorar, peça ajuda, não tenha vergonha de ser humano. Fraco é aquele que se acha invencível. Um dia de cada vez. É muito difícil, mas é o que se tem a fazer," finalizou.

Eugênio Xavier

Arquivo Pessoal/ Eugênio Xavier