Brasil abre 21 mil leitos de UTI durante pandemia, mas oferta ainda é desigual

Brasil abre 21 mil leitos de UTI durante pandemia, mas oferta ainda é desigual

 

O estudo mostra ainda que quase metade dos leitos de UTI existentes hoje no país estão em capitais. Esse cenário se repete tanto no SUS quanto na rede privada e indica parte do desafio da interiorização da Covid-19 no país. Em três estados –Amazonas, Roraima e Amapá–, os leitos estão disponíveis apenas nas capitais.

Os dados levantados pelo CFM mostram ainda que, entre as regiões, o Sudeste responde pela maioria dos leitos abertos, seguido por Nordeste, Sul, Centro-Oeste e Norte.

Nos últimos anos, estados de algumas dessas regiões já eram conhecidos pelo déficit de leitos de UTI em relação a parâmetros recomendados por entidades do setor. Um deles, indicado pela Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira), aponta como ideal a existência de um a três leitos no mínimo para cada 10 mil habitantes.

Quando considerados apenas os leitos convencionais de terapia intensiva (uma vez que os destinados para a Covid-19 seriam temporários), 14 estados têm o total de leitos disponível na rede pública abaixo desse patamar.

Para o conselho, isso indica que ainda há insuficiência. "Como o incremento de quase 20 mil leitos públicos e privados de UTI objetivou o atendimento exclusivo de infectados com o novo coronavírus, o país continua a contar com uma infraestrutura insuficiente para acolher pacientes com outras doenças", disse a entidade, em nota.

O CFM defende que parte dos novos leitos abertos para atendimento de Covid-19 seja mantida por mais tempo –por causa da curva ainda crescente de casos em algumas regiões– e incorporada de forma definitiva após a pandemia.

"Pelos dados, sem estes leitos criados nos últimos meses exclusivamente para atender a demanda crescente de infectados, deve permanecer o quadro de desigualdade na distribuição dos leitos de UTIs", afirma.

Um apelo semelhante tem sido feito pelos secretários estaduais de Saúde. Recentemente, eles enviaram ofício ao Ministério da Saúde pedindo a garantia de financiamento dessas unidades.

No documento, obtido pela reportagem, o grupo lembra que a ampliação de leitos ocorreu em meio a um cenário de falta de estrutura em parte da rede.

"A ampliação dos leitos públicos se deu a partir de sua conhecida insuficiência. Ainda assim, na pandemia, foi o SUS o nosso principal anteparo em relação aos leitos clínicos e de UTI", diz o ofício, assinado pelo Conass, conselho que reúne os gestores. "O investimento nessa nova estrutura nunca é desperdício, e precisa ser entendido como imprescindível."

Para Donizetti Giamberardino, do CFM, parte dos novos leitos deve ser fechada por estar em hospitais de campanha, por exemplo. A estimativa é que esse tipo de estrutura responda por ao menos 20% dos novos leitos para a Covid-19.
Os demais, no entanto, poderiam ser incorporados. "Nos estados brasileiros que já têm mais carência de leitos, especialmente no Norte e no Nordeste, é importante que esses leitos sejam mantidos", diz.

Ele atribui o problema da menor proporção de leitos na rede pública ao subfinanciamento também do SUS. "Quando o Estado não assume fortemente a política de saúde, acaba acontecendo uma lógica de mercado. Se formos calcular quanto se gasta em saúde no Brasil, cerca de metade fica com o SUS, que corresponde a 75% da população [de forma exclusiva], enquanto a outra [gasta metade] e tem 25%. Isso já mostra a disparidade", diz.

Além dos recursos, especialistas e gestores de saúde também têm apontado a necessidade de enfrentar outros gargalos para manutenção dos leitos, como a oferta de médicos intensivistas para atuar nesses locais, por exemplo.

Para Giamberardino, a maior oferta de estrutura nas capitais "faz parte de um contexto, mas é exageradamente desigual".

Ele chama atenção para outras carências na rede. Uma delas é que, em sete estados, nenhum dos leitos de UTI abertos é reservado à assistência de crianças.

"Lógico que a incidência de doenças graves em crianças é muito mais baixa do que entre idosos, mas é preciso ter uma proporcionalidade", afirma.

Questionado pela reportagem sobre a possibilidade de manutenção dos leitos, o Ministério da Saúde afirma que fará um estudo para analisar a situação.

"Estamos iniciando um estudo para verificar os municípios-polo que concentram as demandas das cidades. [A incorporação de leitos] vai aumentar as despesas relativas ao SUS e isso deve ser conduzido de forma responsável para que haja sustentabilidade no decorrer do tempo", disse nesta segunda-feira (3) o secretário-executivo da pasta, Élcio Franco.

Em nota divulgada na última semana, a pasta diz já ter investido R$ 1,6 bilhão para habilitar 11.353 leitos de UTI exclusivos para a Covid. Deste total, 247 são leitos pediátricos.

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