300 mil bebês deixaram de nascer no Brasil por pandemia e divórcios

Esse cenário fez com que não se cumprissem as previsões populacionais feitas previamente para 2020 e 2021, como observa José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e pesquisador aposentado do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Diniz Alves analisou o comportamento da população brasileira no último ano e meio e identificou fatos importantes – alguns deles inéditos em um país que cresce sem parar desde que foi colonizado pelos europeus, cinco séculos atrás.

1) Menos nascimentos, ou nada de “baby boom” até agora

Quem imaginava que o enclausuramento provocado pela pandemia provocaria um “baby boom” se enganou, explica Diniz Alves à BBC News Brasil.

“A pandemia provocou uma queda na natalidade no mundo inteiro”, diz. “Quem pôde adiar a maternidade, no caso de casais jovens, adiou. (…) Mesmo que tivesse havido mais sexo (entre pessoas quarentenadas em casa), hoje em dia existe uma separação entre sexo e reprodução. Houve muito medo de a mulher grávida ficar doente, medo de o hospital estar sobrecarregado. Basta adiarem-se 20% dos nascimentos para haver um impacto grande na taxa de natalidade.”

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Esse impacto já foi sentido em 2020, de gestações possivelmente adiadas logo nos primeiros meses do ano. Enquanto houve em 2019, quase 2,8 milhões de bebês nascidos no país, no ano passado esse número caiu para pouco mais de 2,6 milhões, segundo o Portal da Transparência do Registro Civil.

Se considerarmos que a projeção do IBGE era de que o Brasil teria 2,9 milhões de bebês nascidos no Brasil em 2020, tivemos, na prática, 300 mil bebês a menos do que o esperado.

E Diniz Alves explica que essa redução deve se aprofundar ainda mais neste ano, porque os adiamentos de gestações provavelmente continuaram ao longo do ano passado e do primeiro semestre deste.

O aumento no número de divórcios (15% a mais apenas no segundo semestre de 2020, em relação ao mesmo período de 2019) e a queda no número de casamentos também contribuem para menos concepções de bebês.

Vale lembrar que esse fenômeno não é inédito: por exemplo, quando eclodiu a epidemia de síndrome congênita da zika em bebês, entre 2015 e 2016, também houve um recuo momentâneo na natalidade do Brasil, diante do medo das mulheres em engravidar.

A expectativa, prossegue Diniz Alves, é de que, passado o coronavírus, a taxa de natalidade brasileira volte aos patamares anteriores à pandemia, na casa dos 2,8 milhões de bebês por ano.

Uma ressalva: isso é muito abaixo dos 4 milhões de bebês que nasciam anualmente no Brasil na década de 1980 – e a culpa é da transição demográfica brasileira, sobre a qual falaremos no final desta reportagem.

2) Crescimento da população bem menor do que o previsto

Antes de a pandemia eclodir, o IBGE havia projetado que o Brasil veria sua população aumentar em 1,574 milhão de pessoas no ano passado.

No entanto, diante da baixa na taxa de natalidade, das mortes por covid-19 e da sobrecarga do sistema de saúde, o país terminou 2020 com 1,159 milhão de pessoas a mais, segundo o Portal da Transparência do Registro Civil.

“Portanto, a grosso modo, podemos dizer que o impacto da pandemia foi reduzir o crescimento populacional em 415 mil pessoas em 2020”, explica Diniz Alves.

Isso deve se intensificar neste ano: com ainda mais mortes por covid-19 do que no ano passado e menos nascimentos, “o Brasil deve ter 1 milhão de pessoas a menos do que estava previsto nas projeções do IBGE para 2021”, prossegue o demógrafo.

3) RJ e RS: os Estados onde a população chegou a encolher

Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, os Estados com maior proporção de população mais velha, registraram mais mortes do que nascimentos entre janeiro e maio de 2021.

Foi uma variação breve e temporária – decorrente, obviamente, do pico de mortes por covid-19 -, mas muito importante: trata-se da primeira vez que isso acontece na história do país.

“É uma grande e inédita novidade para a demografia brasileira, (…) que tem uma história de 521 anos de crescimento demográfico contínuo e ininterrupto”, escreveu Diniz Alves em artigo.

Eis os dados: segundo o Portal da Transparência do Registro Civil, o Estado fluminense teve 79.038 nascimentos e 79.570 óbitos de 1° de janeiro a 29 de maio deste ano.

Ou seja, houve uma redução vegetativa de 532 pessoas no período, explica o demógrafo.

No Rio Grande do Sul, foram 53.832 nascimentos no período, e 54.218 óbitos. Na ponta do lápis, uma população com 386 pessoas a menos.

A expectativa de Diniz Alves é de que a população desses Estados termine o ano de 2021 praticamente “empatada”, sem decréscimos ou aumentos consideráveis.

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